A Fundação Getúlio Vargas produz um novo índice para comparar a situação dos dois países com o mesmo parâmetro. Em 2022, o Brasil tinha 23,5% da população pobre, a Argentina 10,9%.
Em meio ao debate sobre a taxa de pobreza na Argentina, um novo cálculo surge de um país vizinho. Medida como no Brasil, a pobreza na Argentina é de 10,9%. Os dados são de um estudo realizado pelo FGV Social, Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que desenvolve um indicador para acabar com as diferenças nos parâmetros utilizados por cada país.
É assim que explica o jornal Folha de São Paulo com o título “Apesar das crises na Argentina, a pobreza no Brasil continua maior, diz pesquisador“:
Apesar de ter crescido na Argentina sob o governo de Javier Milei e caído no Brasil com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a proporção de argentinos pobres é bem menor que a de brasileiros, quando observada por um mesmo parâmetro. Em 2022, a Argentina tinha 10,9% de pobres, enquanto o Brasil tinha 23,5%, de acordo com cálculos de Marcelo Neri, diretor da FGV Social, que construiu uma série histórica comparando a pobreza nos dois países de 2011 a 2022.
Para fazer a comparação entre os vizinhos, o pesquisador considerou a linha de pobreza equivalente a uma renda mensal inferior a R$ 666 por pessoa. R$ 666 no Brasil são 110 dólares (em 26 de dezembro). Para não ser pobre na Argentina, você precisa de $ 324.099 (US$ 270 ou R$ 1.700) de acordo com o INDEC (Instituto Nacional de Estatísticas e Censos). Para não ficar em indigência (pobreza extrema), são necessários $ 142.149 (US$ 120 ou R$ 740). A linha de pobreza do Brasil está abaixo da linha de indigência da Argentina.
Os últimos dados disponíveis do FGV Social são de 2022. “No Brasil, de 2022 a 2023, a pobreza diminuiu. Em 2024 ela voltará a cair, devido ao crescimento esperado do PIB (Produto Interno Bruto), mas ainda temos que aguardar os dados”, especula o pesquisador da Fundação Getúlio Vargas. Neri destaca que: “É a diferença entre a foto e o filme. A Argentina era um país mais rico há alguns anos, mas declinou. No Brasil, embora a pobreza seja maior, ela recuou”.
As pesquisas dos dois institutos: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, e INDEC, na Argentina, não são comparáveis, porque as metodologias usadas para calcular a pobreza nos dois países são diferentes. “Tudo depende do termômetro; o que tentamos fazer (com a série FGV Social) foi usar o mesmo medidor para olhar para a Argentina e o Brasil.”
De acordo com a série FGV Social, o ano em que a pobreza nos dois países foi mais próxima foi 2020, durante a pandemia, quando os efeitos do Auxílio Emergencial reduziram a pobreza no Brasil para 18,7% (e na Argentina, para 15,4%). Os dados diferem dos apresentados esta semana pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (IDB) comparando os níveis de pobreza de todos os países das Américas: o Brasil está com 31% e a Argentina com 21%. O estudo considera pobres aqueles que vivem com menos de US$ 6,85 por dia e segue a referência do Banco Mundial para países de rendimento médio-alto. É o mesmo parâmetro utilizado pelo IBGE.
Comparar peras com maçãs
No discurso dos políticos, na mídia e, obviamente, nas redes sociais brasileiras, é comum encontrar debates sobre a difícil situação econômica da Argentina tendo como argumento a taxa de pobreza. Não há acordo sobre o culpado da situação, mas a maioria concorda que metade dos argentinos é pobre. O que eles não sabem é que as medições são feitas com parâmetros diferentes.
Em 3 de agosto de 2022, escrevi no Perfil:
O presidente Jair Bolsonaro (PL) escreveu hoje no seu Twitter: “Lamento a oficialização do uso da “linguagem neutra” pela Argentina. No que isso ajuda o seu povo? A única mudança provocada é que agora há “desabastecimente”, “pobreze” e “desempregue”. Que Deus proteja os nossos irmãos argentinos e os ajude a sair dessa difícil situação”.
(…) Mas, mesmo nesse processo de crise permanente, ainda há indicadores de que a qualidade de vida dos “hermanos” é melhor do que a dos brasileiros. Um deles é, precisamente, um dos mencionados por Bolsonaro, o desemprego, chega a 7% na Argentina e 9,3% no Brasil.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), calculado pela ONU a partir de um conjunto de indicadores socioeconômicos, foi em 2019 de 0,845 na Argentina, contra 0,765 no Brasil (quanto mais perto de 1 o IDH, melhor é o desenvolvimento do país). A expectativa de vida de um argentino ao nascer em 2020 era de 76,81 anos, contra 76,08 dos brasileiros, segundo dados recopilados por countryeconomy.com.
O PIB per capita de Argentina em 2021 foi de 9072 dólares contra os 6359 de Brasil. E a taxa de homicídios é de 20.86 por cada 100.000 habitantes no Brasil contra 5,12 na Argentina.
Se um extraterrestres buscasse um lugar para viver, sem seguir a opinião de Bolsonaro, escolheria Itaim ou Palermo?
De lá para cá, alguns dados mudaram, não muito. O desemprego caiu muito no Brasil e pouco na Argentina. Na quarta-feira, 4, o IBGE anunciou que a pobreza e a extrema pobreza no Brasil atingiram os menores patamares da série iniciada em 2012, com uma parcela da população considerada pobre em 27,4%.
Na Argentina, a pobreza medida pelo INDEC atingiu 52,9% da população no primeiro semestre deste ano, 11,2 pontos a mais do que no mesmo período de 2023. Na semana passada, o Conselho Nacional de Coordenação de Políticas Sociais, subordinado ao Ministério do Capital Humano, informou que o índice caiu para 38,9% no terceiro trimestre de 2024. A indigência, segundo o mesmo relatório, está em 8,6%. Para não ser indigente na Argentina, você precisa de $ 142.149 (US$ 120 ou R$ 740). Mais do que os R$ 666 necessários para não ser pobre de acordo com o novo índice FGV Social. O número não é diferente do de 2022, mas temos que aguardar a atualização oficial.
Os índices dessa nota de perfil, atualizados com os últimos dados disponíveis em countryeconomy.com, estão aqui:
Outros dados que não estavam nessa análise e que serão fundamentais no futuro estão nesta tabela: